Processos Comunicação Digital, Panorama da Arte Tecnológica


Santaella, Lúcia, Culturas e Artes do Pós-Humano, São Paulo, 2003
Panorama da Arte Tecnológica
De acordo com a autora, a arte tecnológica dá-se quando o artista produz a sua obra via mediação de dispositivos tecnológicos que materializam conhecimento cientifico. No que refere à concepção da arte a autora posiciona o Renascimento como a época em que a arte visual se desprendeu da sua dependência religiosa. No que concerne à tecnologia, a autora associa a produção da arte aos suportes, dispositivos e recursos para produção e distribuição.

Tendo por base a evolução da tecnologia ao longo da história, e da percepção da arte, a autora refere que cada fase da história tem os seus próprios meios, isto é tecnologia, sendo que o desafio do artista é o de enfrentar a resistência dos materiais e tecnologia do seu tempo, e encontrar a linguagem mais apropriada. Daí que se até ao Renascimento e mesmo até ao século XIX as artes eram essencialmente produzidas com meios artesanais, a partir  daí, com a revolução industrial aparecem várias tecnologias, entre as quais as máquinas de imagens, começando com a fotografia, que determina o nascimento das artes tecnológicas. O impactos da máquina de imagem são expandidos pelo impacto social, cultural e artístico derivado da explosão da demografia, aparecimento de grandes centros urbanos e a cultura das massas, sendo que a autora remete para os trabalhos de Walter Benjamim, relativos ao “homem na multidão” enquanto contexto social da época.
A partir do século XIX, 1920,  surgem as vanguardas artísticas, como o cubismo, surrealismo e especialmente o dadaísmo que levou a uma crise dos suportes tradicionais da arte de forma radical e a mediação e aplicação dos processos artísticos tradicionais através da tecnologia. Com o movimento Fluxus em 1950-1960,, desenvolve-se uma reacção crítica e céptica contra a tecnologia, através da apropriação de seus produtos colocados fora do seu contextos e maltratados, numa lógica de antimáquina e destocado a chocar a sociedade industrial. Para a autora, este tipo de ruptura, é sintomático com o aparecimento de uma nova linguagem onde primeiro tem-se um impacto sobre as formas e meios predecessores, e depois entra-se numa fase de experimentação e de ruptura. A partir dos anos 60, entra-se numa fase de aparecimento de novas tecnologias e experimentação, em particular com a fotografia, vídeo/televisão e cinema, onde predominam as videoinstalações e videoperformances com trabalhos de Paik, Joan Jonas, Michael Noll e Billy Kluver, que permitem uma renovação dos princípios da arte, levando ao aparecimento da arte cinética ou arte computacional, numa lógica de hibridização, criação cientifica, criação artística e criação industrial.  A Autora refere Ben R. Laposky, que já nos anos 50 descrevia as suas criações como um exemplo da possibilidade de se empregar tecnologia moderna na arte e de demonstrar a relação entre arte e ciência.

Uma das vertentes fundamentais para o advento da arte tecnológica está associada ao conceito de instalação, que pode ser vista como uma extensão do estúdio para o espaço social. Este conceito de instalação surge num ambiente contestatário antimuseu, mas é mais tarde absorvido por este tipo de espaço. No entanto, com as telecomunicações, enquanto meio de transmissão, que permite o surgimento de movimentos de arte telemática, net art ou web arte, nomeadamente nos anos 90. Estas telecomunicações, permitiram a explosão das instalações num espaço fechado, para um intercambio, ubiquidade e desmaterialização da arte, bem como uma nova forma de interacção através de interfaces, nomeadamente na imagem informática. Um dos autores de referência é Nam June Pike, segundo a autora.
A partir dos anos 90, além das telecomunicações com vídeo, a imagem processada computacionalmente, segundo a autora, parecia ter um potencial ilimitado, levando a que a digitalização pudesse ser vista como uma tecnologia que levou a imagem a saltar para o paradigma pós-fotográfico com todas as consequências que isso trouxe para a sua produção, armazenamento, difusão e recepção.  Esta nova revolução, poderá trazer consequências antropológicas e socio-culturais profundas, com o advento da cibercultura e comunidades virtuais.

Na era digital, segundo a autora, não está em causa somente a utilização de linguagem multimédia digital, mas também a possibilidade de comunicação instantânea, ao vivo, criando redes globais e formas de interacção diferenciadas e participativas. Esta arte, denominada interactiva, envolve assim a mediação por computador e uma participação activa do receptor. Com a realidade virtual, e distribuída, cria-se um ciberespaço de ambientes multi-utilizador com projecção em  novos territórios de sensorialidade e sensibilidade.
Daí que a autora, aponte como tendências da arte digital, enquanto tendências para um conceito mais abrangente de ciberarte, ligado a uma cibercultura, onde do espaço físico, mesmo de museus, passasse para instalações-remotas, denominadas de net instalações, ciberinstalações, videoinstalaçõe multimédia, assente em conceitos de interactividade, acessos remoto e hibridização. Nestas instalações, as interacções poder ser com sensores ou webcams, para colocar em acção o conceito de ambientes virtuais, com telepresença e telerobótica. Nestes ambientes, segundo a autora, o receptor passa a habitar mentalmente o mundo simulado enquanto o seu seu corpo físico se encontra ligado para permitir a viagem imersiva neste espaço.  Num outro domínio mais complexo, a autora aponta como tendências, o diálogo entre o biológico e sistemas artificiais, com utilização de inteligência artificial para se implementar técnicas de engenharia genética para permitir de forma mais realista projectar o corpo e mente do receptor num espaço simulado de ambiente virtual.

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